Domingo, 31 de Maio de 2009
PRISÃO E PROVAÇÕES DE LUÍS FERNANDES EM TERRITÓRIO SOBRE ADMINISTRAÇÃO PORTUGUESA DE MOÇAMBIQUE
Para acabar, para já, com esta saga sobre os acontecimentos de Moçambique e relacionados, quero falar hoje da prisão do Capitão Luís Fernandes.
O Luís já tinha sido vítima de represálias aquando da sua tomada de posição no jornal Expresso (Maio 74). Em 7 de Setembro encontrava-se em Lisboa. Pouco tempo depois avança para Moçambique, enquanto o Comandante das Operações (um Coronel) aguardava, na África do Sul, para entrar em Moçambique de acordo com o desenvolvimento das acções do nosso Luís.
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Capitão Luis Fernandes (foto de 30/05/2009) |
Entrando (semi-clandestinamente) em Moçambique por via-férrea é transportado para Lourenço Marques (como ajudante de camionista). Na sua bagagem o seu uniforme. Várias vezes parado pelo bloqueio frelimista e dos MFA, consegue, contudo, chegar à capital de Moçambique, onde inicia (de imediato) os seus contactos. Traído por alguém é preso pelo MFA em 19 de Outubro de 74. É interrogado pelo famoso Capitão Camilo (Hoje Major General desta tropa que temos, e nomeado - por Paulo Portas !!!! - vice presidente da liga dos combatentes).
Dois dias depois (e já resultado da sua acção) ocorre a revolta dos Comandos, que eles tiveram grande dificuldade em travar.
Com ele livre e junto dos GE e GEP seria muito difícil ao MFA aguentar-se!
O resto da história é conhecido. Luís Fernandes é entregue (pelas FFAA “portuguesas”???) à Frelimo. E transportado em avião militar português para as bases da Frelimo, juntamente com Joana Simeão e etc. A ordem de entrega à Frelimo é também do MFA Camilo. (o amigo do Portas!!! - Paulo, que não Miguel…).Pela primeira vez na História de Portugal um Oficial do nosso exército é entregue ao inimigo.
E só em Janeiro de 1976, depois de passar o indescritível, é que o Luís é solto (depois de um período de “engorda e restabelecimento” propiciado pela Frelimo para evitar demasiadas críticas internacionais. Regressado a Lisboa, poucos dias depois está já em Madrid, parta continuar o combate, apesar de bastante diminuído fisicamente. Porque moralmente nunca o conseguiram abater, pese embora a quantidade de fuzilamentos a que assistiu.
E, já em Madrid, dispôs-se a continuar de imediato o seu combate. Fosse onde fosse e para o que fosse. Foi aí que eu (acabadinho de regressar de umas coisas) o reencontrei e pude de novo abraçá-lo comovidamente!
PRISÃO DE LUÍS FERNANDES
Pois, eu passo a vida a dar o dito por não dito. Disse que encerrava - para já - o dossier Moçambique e eis que encontro na minha papelada a primeira entrevista dada por Luís Fernandes sobre o seu calvário. Não resisto a publicá-la na íntegra. Também há entrevista ao Diabo. Vou ver se a encontro.
Pois aqui vai:
“MOÇAMBIQUE POR DETRÁS DAS GRADES - ANTES E DEPOIS DA INDEPENDÊNCIA
Andava eu, algures, por terras do Algarve, cumprindo o meu roteiro profissional, quando por felicidade inesperada encontrei um velho Amigo e Camarada – o termo é militar – que supunha irremediavelmente perdido pelas latitudes tropicais de Moçambique, nos campos de concentração da Frelimo, malgrado as afirmações peremptórias do ministro Vítor Crespo, a 7 de Dezembro do ano, negando a existência de prisioneiros portugueses no paraíso de Machel.
Recordo-me da última vez que nos abraçámos. Foi no Hospital Militar de Lourenço Marques, onde, em circunstâncias diferentes nos encontrávamos. Eu com baixa e ele de consulta, mas cercado por antigos companheiros de armas como se de um criminoso se tratasse.
Luís Fernandes, capitão miliciano dos “GEP`s”, era uma das muitas vítimas imoladas no holocausto da descolonização concebida pelos “moscovozinhos” da nossa Pátria. Mas deixemos que seja Luís Fernandes a fazer-nos o relato do nosso Portugal oitocentos anos secular, reduzido como está agora, às dimensões anãs do ano de 1400.
DETIDO COM APARATO EM LOURENÇO MARQUES
Século – Quando e onde se deu a detenção que se prolongou num cativeiro de 16 meses?
Cap. Luís Fernandes – Foi em Lourenço Marques e no Hotel Polana, em 18 de Outubro de 1974. A detenção foi efectuada por dois capitães do Exército Português, que se encontravam acompanhados por cerca de quinze militares da Polícia Militar.
Século – Perante tamanho aparato militar a surpresa decerto não foi pequena, até porque, aparentemente, nada justificava a referida actuação por parte das Forças Armadas…
Cap. Luís Fernandes – Exactamente, eu estava hospedado no Hotel Polana, sem problemas de ordem jurídica, porquanto pagava as minhas contas e não provocava desacatos, pelo que não havia alguma razão que motivasse qualquer medida a tomar pelas autoridades civis ou militares da Província de Moçambique.
Século – Quais foram os motivos alegados para a detenção que obrigou à mobilização espalhafatosa de mais de uma dezena de militares?
Cap. Luís Fernandes – Os motivos não foram de ordem jurídica mas do que se pode considerar de ordem revolucionária. Foram fundamentados em suspeitas que se afirmavam existir a meu respeito, quanto a supostos “crimes” contra a descolonização, o que constitui matéria não prevista no Código Penal Português em vigor, nem em qualquer diploma existente naquela altura.
Século – Portanto, não houve acusação de um delito concreto…
Cap. Luís Fernandes – Não havia qualquer acusação concreta. Havia, sim e apenas, o termo genérico de “crimes contra a descolonização” que era uma matéria que justificava ou pretendia justificar todas as prisões arbitrárias que se sucederam a partir da minha detenção em Lourenço Marques, e foram em crescendo até ao período da entrega total da Província de Moçambique à Frelimo, por altura da independência.
DESERTORES E GUERRILHEIROS – “AS NOSSAS TROPAS”
Século – Verificada a detenção foi-lhe facultada a assistência de um advogado, ou terão decorrido os interrogatórios sem a satisfação dessa norma elementar?
Cap. Luís Fernandes – Fui preso, como anteriormente afirmei, por indivíduos trajando civilmente, mas identificados como elementos da Polícia Militar Portuguesa e oficiais do Exército, nomeadamente dois capitães. Estes transportaram-me para o Quartel-General do Comando Territorial do Sul, onde cheguei às 4 horas da madrugada do dia da minha detenção, tendo seguido escoltado pela P.M. para uma sala que era, se não erro, a 2.ª Repartição. Nessa sala aguardava-me um representante da Frelimo, recém-instalada em Lourenço Marques, que não era nada menos que um desertor da Força Aérea Portuguesa, concretamente, Jacinto Veloso, ex-tenente da F.A.P., que anos antes se tinha passado para Dar-es-Salam a bordo de um bombardeiro “T/6″ que entregou ao inimigo, estando assim dentro do estabelecido pelo Código de Justiça Militar para os casos de pena de morte.
Concluindo, não me foi permitido um advogado e como inquiridor nomearam um desertor das Forças Armadas Portuguesas.
Século – Quer dizer então que foi interrogado por Jacinto Veloso?
Cap. Luís Fernandes – Não. Aquele desertor pretendeu de facto interrogar-me, mas como recusou identificar-se, quando por mim instado, também me neguei ao diálogo por ele proposto. Fiquei assim a aguardar interrogatório posterior entre dois guerrilheiros uniformizados da Frelimo, e de resto mal uniformizados, os quais me apontavam ameaçadoramente as suas espingardas “kalashs”.
Ante atitude tão insólita, porque era um antigo combatente português, preso por oficiais portugueses e pela Polícia Militar do meu país, perguntei a um dos capitães que interveio na minha detenção – capitão Camilo – se não havia ninguém mais, para além dos guerrilheiros da Frelimo, para me guardar, ao que me respondeu, ironicamente, dizendo eu estar a leste do Acordo de Lusaka, porque naquele momento os guerrilheiros eram “as nossas tropas”. Não haja espanto, porque as “ironias” do capitão Camilo não ficaram por aqui, antes se salientaram quando, no primeiro interrogatório, não obtendo o que pretendia, como afirmações susceptíveis de comprometer determinadas individualidades civis e militares, me ameaçou com a entrega à Frelimo que poderia ocasionar uma atitude mais colaborante da minha parte.
Perante a minha indignação – que se expressou do seguinte modo: será você capaz de entregar à Frelimo antigos camaradas de guerra? – Respondeu o capitão Camilo que, naquele momento, o inimigo era eu.
ROTEIRO DO PRISIONEIRO
Século – Foi sujeito ao longo dos interrogatórios levados a cabo pelo capitão Camilo a uma persuasão agressiva, com ameaças físicas?
Cap. Luís Fernandes – Ele não me ameaçou propriamente com maus tratos físicos, mas deixou entender, para quem não fosse desprovido de imaginação que o tratamento dado pela Frelimo não seria o previsto na Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Século – Relate-nos, cronologicamente, o seu primeiro roteiro como prisioneiro.
Cap. Luís Fernandes – Fui detido às 3 horas da madrugada de 18 de Outubro de 1974 e no próprio dia transferido para a cadeia da Machava onde me mantiveram no mais absoluto segredo durante quatro dias. Ao cabo de dois ou três interrogatórios ao estilo daquele que já citei, fui conservado em regime de menor vigilância dentro dessa prisão, tendo em seguida sido transferido, com outros companheiros entretanto presos, para a Penitenciária de Lourenço Marques.
Mas, deixe-me referir, no que respeita às atitudes dos inquiridores durante o processo instrutório que o tal capitão Camilo reconheceu não haver contra mim qualquer prova de ordem jurídica mas, acrescentou, que no período revolucionário as provas jurídicas não tinham importância relativa e se era verdade que a meu respeito não tinham provas, também não tinham dúvidas. Isto significava, nos termos do “revolucionário” Camilo que podiam fazer de mim o que desejassem e achassem mais útil. E fizeram…
Século – Portanto, situa-se este relato que faz em período anterior à independência de Moçambique…
Cap. Luís Fernandes – Precisamente. Todo o relato que acabo de fazer situa-se no período do chamado Governo de Transição, em que a autoridade era exercida em nome do Presidente da República por um Alto-Comissário que representava a Soberania de Portugal em Moçambique, na medida em que era a Bandeira Verde-Rubra que lá se içava legal e legitimamente.
Século – Quando foi entregue à Frelimo e como se verificou a transferência dos prisioneiros portugueses sob a alçada da responsabilidade do Alto-Comissário para os carcereiros de Machel?
Cap. Luís Fernandes – Houve vagas sucessivas, seguidas de dois em dois dias, em que alguns elementos escolhidos, não sei com que critério, mas habitualmente antigos militares passados à disponibilidade em alturas muito recentes foram transferidos das autoridades portuguesas do Comando Territorial do Sul, em Lourenço Marques, para as pseudo-autoridades da Frelimo. Muitos foram enviados para Porto Amélia e dali para as chamadas “zonas libertadas”, no interior do Distrito de Cabo Delgado.
Século – A vossa ida para os campos de concentração existentes nas “zonas libertadas” efectuou-se antes ou depois do 25 de Junho de 1975?
Cap. Luís Fernandes – Fomos enviados para os campos de concentração como prisioneiros da Frelimo cerca de três meses antes da data da independência de Moçambique, ou seja, em plena vigência da autoridade do Alto-Comissário. Em plena vigência da autoridade do hoje general Melo Egídio, então Comandante do Comando Territorial do Sul, a quem os presos estavam confiados e, portanto, esta transferência nunca se poderia ter dado sem o consentimento do Alto-Comissário da República Portuguesa, Vítor Crespo.
AVIÃO DA FORÇA AÉREA PORTUGUESA TRANSPORTOU PRISIONEIROS DE MUEDA PARA A TANZÂNIA
Século – Para que “campos de recuperação” foram posteriormente conduzidos?
Cap. Luís Fernandes – Antes de sermos enviados para os chamados “campos de reeducação” da Frelimo, transferiram-nos para Mueda, onde em bloco fomos submetidos a julgamento popular, que teve por consequência a nossa condenação à morte sob as acusações mais diversas e caricatas, tendo a referida pena sido substituída, ulteriormente, por trabalhos forçados indefinidos.
O grupo de prisioneiros era então constituído por portugueses originários da Metrópole e alguns elementos oriundos da Província de Moçambique, dos quais citarei a Dr.ª Joana Simeão, Pedro Mondlane e outros dirigentes indígenas que haviam desertado das fileiras da Frelimo e recolhido às autoridades portuguesas para se reintegrarem na Comunidade Lusíada, e depois por estas entregues aos apaniguados de Samora Machel. Lembro-me de alguns nomes destes últimos: Dr. Júlio Razão e o Eng. Paulo Marquesa.
Após o julgamento popular foram os portugueses originários da Metrópole dispersos por diversas bases que serviam de campos de concentração, nomeadamente a Base Beira, próximo de Nangade e de Omar, a Base Moçambique –. A também conhecida por Base Central, localizada relativamente perto do Nangololo, a Base Gungunhana é outras cujo indicativo não recordo.
Quanto ao grupo formado por elementos naturais da Província Portuguesa de Moçambique, foi-lhes dado como destino o Campo de Nashingwea, no território da Tanzânia, sendo para ali transportados em avião militar português, Nord/Atlas da Força Aérea Portuguesa, que rumou da pista de Mueda para Dar-es-Salam.
PRISIONEIROS ABANDONADOS PELAS AUTORIDADES PORTUGUESAS
Século – Qual o número de portugueses seus companheiros de cativeiro nos campos de concentração de Cabo Delgado?
Cap. Luís Fernandes – Dos presos pelas autoridades militares de Lourenço Marques, éramos sete. Mas, para além de nós, havia nas prisões e campos de concentração da Frelimo muitos ex-militares portugueses, principalmente elementos de tropas especiais, directamente detidos por guerrilheiros ainda no período em que a única soberania que se exercia oficialmente em Moçambique era a de Portugal, sem que isso obstasse o total abandono a que nos votaram na altura da independência em circunstâncias deploráveis, que facilmente se imaginam.
Acho que não serão necessários grandes raciocínios para classificar esta situação como escandalosa, pois que para além dos aspectos humano, político e patriótico que encerra, denuncia uma aberração jurídica que, por si só, define uma capitulação total de uma autoridade que se recusava a existir por abdicar dos seus direitos e deveres para com os cidadãos que representava.
Século – Punham-vos ao corrente das “démarches” que entretanto se promoviam com vista à vossa libertação?
Cap. Luís Fernandes – De modo algum. Para que faça uma ideia da nossa existência, peço-lhe que recorde as imagens do filme “O Planeta dos Macacos” e dimensione a nossa vivência à dos extraterrestres desvinculados de qualquer rumor da civilização. Para além de tudo o mais, tínhamos os responsáveis da Frelimo pela nossa vigilância que gaguejavam, e muito mal, o português, sendo carcereiros cuja missão era a de nos dificultar a todo o momento a vida e não segredar-nos palavras de esperança.
TRABALHOS FORÇADOS SEM OBJECTIVOS DE RENTABILIDADE – EVACUAÇÃO DE TÁXI AÉREO
Século – Pode concretizar o tipo de regime a que vos sujeitavam os homens da Frelimo?
Cap. Luís Fernandes – Éramos sujeitos a um regime de trabalhos forçados da mais diversa ordem, principalmente no domínio agrícola. É evidente, mesmo para quem desconheça as realidades locais, que o estilo de produção é do mais primitivo possível, sendo o trabalho totalmente manual, de resto de pouca rentabilidade económica, até porque os trabalhos a que nos sujeitavam eram destinados mais a tornar-nos a vida insuportável do que a visar objectivos rentáveis.
Século – Quando se verificou o vosso regresso a Lisboa?
Cap. Luís Fernandes – O nosso regresso realizou-se após a deslocação do Secretário de Estado do Ministério dos Negócios Estrangeiros a Lourenço Marques. Fomos então, (…) de Porto Amélia para a Beira, onde embarcámos com destino a Lisboa, escalando em Luanda.
UM POLÍCIA ESQUECIDO EM PORTO AMÉLIA
Século – Havia ainda em Porto Amélia (Pemba) algum elemento da P.S.P. portuguesa?
Cap. Luís Fernandes – Não. O único polícia português que lá se encontrava e encontra ainda, era um agente de origem europeia e natural de Portugal, detido pela Frelimo e por esta, muito mal tratado. Convém salientar que o referido agente foi abandonado por camaradas seus da P.S.P., que regressaram a Portugal findo o contrato com o governo de Moçambique, em Dezembro do ano passado, sem exigirem o seu repatriamento.
Século – Já não era, portanto, aquando da vossa libertação, embaixador de Portugal em Moçambique, o Dr. Albertino de Almeida?
Cap. Luís Fernandes – Não. Albertino de Almeida que não é, aliás diplomata de carreira mas apenas um advogado, já não se encontrava à frente da Embaixada de Portugal em Moçambique.
De resto, considero oportuno referir que o advogado Albertino de Almeida sempre foi um elemento da confiança do Partido Comunista Português, tendo sido em Angola colaborador directo de Lopo do Nascimento, do M.P.L.A. e talvez por isso se compreenda que quando embaixador de Portugal em Moçambique jamais tivesse tomado uma atitude a favor dos prisioneiros portugueses, como ainda impediu os funcionários consulares de promoverem qualquer diligência no sentido de melhorar a situação dos cidadãos portugueses encarcerados pela SNASP, que são em número superior a três centenas, não obstante as declarações em contrário proferidas pelo ministro Vítor Crespo.
O FURRIEL MOTA DOS COMANDOS AINDA PRESO EM MOÇAMBIQUE
Século – Quando do regresso a Lisboa foram alvo de interesse por parte da Imprensa portuguesa?
Cap. Luís Fernandes – A nossa chegada quase passou despercebida, não tendo havido por parte da Imprensa portuguesa qualquer interesse em saber o que tínhamos passado e o que sucedia ainda aos muitos portugueses detidos em Moçambique, sujeitos a um regime de desgaste físico e psíquico que os visa aniquilar.
Século – Colocamos o nosso espaço ao seu dispor para o caso de pretender referir qualquer assunto que não tenha sido abordado ao longo deste diálogo.
Cap. Luís Fernandes – Gostaria de frisar que há ainda em Moçambique muitos cidadãos portugueses detidos depois da independência daquele território. Há também um caso escandaloso que é o do furriel Mota, dos Comandos, preso pela Frelimo pouco depois da passagem à disponibilidade, antes da independência de Moçambique, portanto ainda sob a soberania portuguesa, o qual se encontra ainda num campo de concentração, ao que suponho algures em Cabo Delgado. Urge que as autoridades diplomáticas e governamentais do nosso País actuem rapidamente, com firmeza e energia, no sentido de serem libertados todos os nossos compatriotas.
Texto de Carlos Didier
In O Século de Joanesburgo, 19.04.1976, pág. 15″
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Cap. Luis Fernandes e Álvaro Teixeira (foto de 30/05/2009) |
PRISÃO E PROVAÇÕES DE LUÍS FERNANDES
“Levado sob escolta militar para o Comando Territorial Sul, fui conduzido a uma vasta sala do edifício. Deparei com dois sujeitos: um, sentado atrás de uma secretária, fardado, com galões de capitão, que se identificou como sendo o capitão Camilo, … Os soldados portugueses retiraram-se e enquanto o capitão Camilo me mandava sentar numa cadeira à sua frente, colocaram-se à minha esquerda e à minha direita, dois jovens guerrilheiros da FRELIMO, andrajosos e sujos, apontando-me as suas Kalashnikovs.
Como reagiste?
Surpreendido ainda protestei, perguntando ao capitão Camilo se não tinha soldados nossos para me guardar e se era preciso que o Inimigo o fizesse. Conservo bem viva na memória a resposta do hoje major-general: “Então você não leu o tratado (sic) de Lusaca? Eles agora são as nossas tropas.” E acrescentou com um sorriso sarcástico: “O Inimigo é você!”
…
Foste interrogado?
Nem por isso. Não com pés e cabeça. O capitão Camilo, satisfeito com o efeito da sua inesperada declaração, perante o meu ar de espanto, folheou a minha agenda e revistou a minha carteira, fazendo-me diversas perguntas a que eu invariavelmente respondia: “não me lembro”. Concluiu, sempre com o mesmo sorriso sarcástico na face, que “eu comia demasiado queijo e que talvez a Frelimo conseguisse que eu recuperasse a memória….”.
Fez-te ameaças?
Não de olhos nos olhos. Só insinuações como a que reproduzi acima. Lá foi dizendo que o tratamento que poderia esperar da Frelimo não seria exactamente aquele que a Declaração Universal dos Direitos do Homem preconizava. Por isso, indignado, protestei com veemência e disse-lhe textualmente que “parecia impossível que um capitão do Exército Português pudesse entregar ao inimigo antigos camaradas de armas” e acrescentei que me mantinha nesta situação “sem terem, em termos jurídicos, encontrado a menor prova contra mim.” O capitão Camilo encolheu os ombros e disse displicentemente que, na presente situação, “se não tinha provas, também não tinha dúvidas, pelo que em termos revolucionários, faria de mim o que entendesse.”
…
Terminado o interrogatório, ficaste preso?
Dada a avançada hora, o interrogatório foi dado por findo e fui levado, com os mesmo aparato militar, para a antiga cadeia da Machava, …
Fui fechado numa cela que, para além da porta de grades tinha uma porta de madeira, pelo que não vias o que se passava no exterior. A alimentação era o rancho da tropa portuguesa, … O oficial português que comandava essa tropa e que vim a conhecer, era cortês.
Voltaste a ver o capitão Camilo?
Duas ou três vezes apareceu o capitão Camilo na cadeia para me interrogar. Nada conseguindo saber pela minha parte. Vinha fardado, conduzindo ele próprio o jipe militar e trazendo como guarda-costas um guerrilheiro armado no banco de trás, como se tivesse aproveitado uma boleia.
Terminado o isolamento juntei-me aos meus companheiros de cárcere no pavilhão onde nos encontrávamos detidos e que tinha as portas abertas.
A prisão ia-se enchendo com a entrada de novos presos e fiquei na mesma cela em que se encontravam um juiz de direito e um engenheiro doutorado por uma universidade sul-africana. O meio era realmente selecto.
Tiveste direito a advogado? Que soubeste do enquadramento legal da tua situação?
Fui visitado por um advogado de Lourenço Marques, Dr. Antero Sobral, pertencente ao grupo dos “Democratas de Moçambique” e que fora um dos signatários dos acordos de Lusaca (a que o capitão Camilo chamava pomposamente de tratado), mas que se dava com amigos meus entretanto refugiados na África do Sul. Mostrou-me a legislação revolucionária entretanto elaborada pelo alto-comissário Vítor Crespo: em dois decretos-lei publicados no Boletim Oficial da Província que “instituíam os crimes contra a descolonização! Como a lei penal não tem efeitos retroactivos se não para benefício dos réus e como já me encontrava preso à data da publicação desses diplomas, não se me aplicavam. Disse-me então o Dr. Antero Sobral, visivelmente constrangido, dada a sua formação jurídica, que nem valia a pena constituí-lo como defensor porque “tudo era feito à margem da Lei, e até contra os princípios gerais do Direito». Agradeci a visita e o seu interesse, tanto mais que éramos adversários políticos.
Além de ti e dos outros seis ex-militares detidos pela mesma altura, houve mais prisões?
Em dada altura juntou-se a nós outro grupo de prisioneiros, também presos pelo MFA. Esses eram todos negros e, se bem que, pessoalmente, não conhecesse nenhum deles, sabia quem eram, pois eram figuras públicas. Todos eles ou quase todos tinham pertencido à Frelimo e tinham, por diversos motivos, abandonado o movimento terrorista, vindo a acolher-se à protecção das autoridades militares portuguesas, bem antes do 25 de Abril. Confiados nas promessas então feitas, tinham permanecido em Moçambique vindo agora ser presos pelo Exército Português. Entre eles, estavam Joana Simeão, Dr. Júlio Razão, Paulo Mondlane, Paulo Gumane, Mateus Gwengere, fomos, mais tardem brancos e negros, levados para a cadeia penitenciária, onde começaram a afluir, em Dezembro de 1974, vagas sucessivas de presos, maioritariamente brancos, sendo muitos deles antigos combatentes oriundos do recrutamento provincial, que haviam passado à disponibilidade, como eu, muito recentemente. Já não havia sequer interrogatórios: aquilo era “um depósito de reaccionários”. Escusado será dizer que o ambiente entre os presos, brancos e negros, era de sã camaradagem e que gozávamos da camaradagem dos soldados portugueses que nos guardavam conjuntamente com o destacamento armado da Frelimo.
O comandante da penitenciária era um capitão de cavalaria que manteve um comportamento correcto connosco, dadas as circunstâncias. Hoje é coronel na reserva e também teve atritos com os turbulentos guerrilheiros da FRELIMO, pelo que regressou à Metrópole farto dos tiranetes do MFA, entre os quais o capitão Camilo, e os “libertadores” de Samora Machel.
Fome e “trabalhos agrícolas”
Foi então que foram entregues à Frelimo e levados para os famigerados “campos de reeducação”?
Sim, cerca de três meses antes da independência de Moçambique. Um dia, de madrugada, apareceu na penitenciária o recém-nomeado inspector da PJ Jorge Costa, antigo estudante contestatário de Coimbra, também ele desertor, à civil e com una pistola-metralhadora a tiracolo que, escoltado por guerrilheiros, nos veio buscar a mim, ao capitão miliciano na disponibilidade Rui Leal Marques e mais cinco metropolitanos, escolhidos a dedo, bem como a um grupo de negros, cuja lista, disse-me ele durante a viagem, fora elaborada pelo capitão Camilo e pelo “camarada” Veloso. Levaram-nos para o aeroporto e daí seguimos viagem até Cabo Delgado num bimotor civil, com escala técnica no aeroporto da Beira. Em Porto Amélia, entregaram-nos ao comando local da FRELIMO e dali seguimos, em Land Rovers,…, passando por Macomia, Chai, Mocímboa da Praia (onde pernoitámos), Diaca, Nacatar, Sagal, Nangololo, até atingirmos finalmente Mueda. Mueda, onde já não havia tropa portuguesa, tinha-se tornado o epicentro da ocupação frelimista de Cabo Delgado. …
Reunidos guerrilheiros e elementos da população autóctone em número apreciável, fomos submetidos a um “julgamento popular”, pelos crimes supostamente cometidos. O comandante Mingas, que era então a autoridade máxima da Frelimo em Mueda, proferiu um longo discurso em Maconde, entrecortado por palavras de ordem. Não entendemos nada do que ele disse, mas não gostámos. Seguidamente, “perfilou-se” diante de nós um pelotão de fuzilamento. Mas a nossa hora ainda não tinha chegado. Tratava-se de uma encenação, imprópria para cardíacos.
Recolhemos à nossa prisão provisória, que era uma antiga caserna. No dia seguinte, aterrou na pista de Mueda um Nord/ Atlas da FAP, pilotado por oficiais portugueses, e os detidos negros (Joana Simeão e todos os outros), foram embarcados, contra sua vontade, para a Tanzânia. Alegavam a sua cidadania portuguesa e, embora o seu portuguesismo de fresca data pudesse ser oportunista. Seja como for, foram levados na Nachingwea e todos eles mortos.
Quanto a nós, os sete brancos e metropolitanos, fomos separados e enviados para “campos de reeducação” situados nas antigas bases Beira, Gungunhana, Central, etc. Longos meses depois, fomos reagrupados em Porto Amélia, onde um casal de médicos búlgaros, cooperantes em Cabo Delgado, mandaram-nos dar injecções, suponho que de vitaminas, para termos um aspecto menos depauperado, e deram-nos também bastante comida para recuperar algo do peso perdido.
Entretanto, na Metrópole tinha-se gerado um movimento para a nossa libertação, tendo até o Dr. Jaime Gama tido uma intervenção nesse sentido na Assembleia Constituinte. A derrota da extrema-esquerda militar em 25 de Novembro de 1975 tornou possível que o ministério dos Negócios Estrangeiros começasse finalmente a actuar e obtivesse, com a ida a Lourenço Marques de um alto funcionário, a nossa libertação.
Como era o dia-a-dia nesses campos?
Fome. Sobretudo fome. E cerca de 14 horas diárias de “trabalhos agrícolas” que, na verdade, nada produziam dada a forma rudimentar como era praticada. Claro que não havia medicamentos nem qualquer tipo de assistência.
Maus tratos?
Sobretudo à nossa dignidade. Mas quase nunca maus tratos físicos. Isto em relação aos brancos. Com os negros, as coisas já eram bastante diferentes.
No entanto, ficaste muito debilitado e vieste a ter problemas de saúde.
Já na Metrópole tive um forte ataque de paludismo e depois de ter feito análises, foi-me diagnosticado uma hepatite não-A e não-B, devida, sem dúvida, à quase inexistente assepsia nos tratamentos a que fomos submetidos em Cabo Delgado. Mais tarde, em 1994, submeti-me a uma biopsia hepática e foi então confirmada uma hepatite C, crónica, com a qual tenho vivido com a graça de Deus.
Passados estes quase trinta anos, como recordas o capitão Lopes Camilo?
Tenho o privilégio de ser sócio da Liga dos Combatentes, com as quotas em dia, desde 1978. Se há sócios que não têm pejo em cumprimentar o major-general Lopes Camilo, considerando de somenos importância as provações que outros combatentes por culpa dele passaram em Moçambique, que lhes faça bom proveito. Quanto a mim não me deixo obnubilar pelo brilho da grã-cruz da Ordem da Liberdade que ele ostenta … no seu uniforme … Não sou obrigado a apertar-lhe a mão, assim como não tive possibilidade de lhe apertar o pescoço quando tão alegremente confraternizava com um desertor.
Mas, como diz o Poeta “a mim ninguém me cala”, que fique aqui registado para “memória futura” (como hoje parece ser moda) o meu depoimento sobre as façanhas do major-general Lopes Camilo em Moçambique nos longínquos anos da vergonha de 1974 e 1975. Decerto o alto-comissário e comandante-chefe de Moçambique que lhe terá outorgado generosamente um ou dois “louvorzinhos” por relevantes serviços ao Exército Português, que se foram agregar à sua já reluzente folha de serviços.
FUI ENTREGUE À FRELIMO
Como fora prometido, eis as declarações de Luís Fernandes, preso por militares portugueses e por eles entregues à Frelimo, quando Moçambique ainda era terra portuguesa. Uma página vergonhosa da nossa «descolonização exemplar» que a correcção política que ora se vive, a brandura consabida dos nossos costumes e alguns compadrios de circunstância tentam fazer esquecer. Luís Fernandes, licenciado em Ciências Sociais e Política Ultramarina, oficial miliciano com o curso de Acção Psicológica, ofereceu-se na Região Militar de Moçambique para os Grupos Especiais Pára-quedistas, onde, concluído o respectivo curso, combateu no mato, meses a fio, os terroristas da Frelimo, primeiro como alferes e depois graduado em capitão. Não aderiu ao MFA e mantém-se coerentemente fiel às suas ideias. Leccionou durante dez anos na Universidade Autónoma de Lisboa, onde foi regente das cadeiras de Introdução às Ciências Sociais, e Ciência Política. Presentemente prepara uma tese de mestrado. Foi um dos fundadores da Associação dos Grupos Especiais e Grupos Especiais Pára-quedistas, de cuja mesa da assembleia-geral é vice-presidente. Continua fascista.
“Mantenho o que disse”
Porém, como se viu na carte que enviou a “O Diabo”, publicada na semana passada, o agora general Lopes Camilo, refuta todas as tuas acusações. Ele invoca, até, uma carreira prestigiante e sem mácula.
Que o senhor major-general Lopes Camilo, no decorrer da sua longa carreira militar, possa ter feito coisas muito meritórias, não o questiono. Nem lhe contesto o valor daquilo que, digno de louvor, eventualmente tenha feito até se envolver na conspiração dos capitães, durante a qual, segundo o então capitão José C. Pais, acompanhou esse oficial, hoje coronel, e outros dois camaradas, os então capitães Lobato Faria e Mariz Fernandes, entregar na Presidência do Conselho o texto aprovado na assembleia de Évora de 9 de Setembro de 1973. Nessa altura, ele, capitão Lopes Camilo aguardou corajosamente num carro, com os então, capitão Vasco Lourenço e tenente Marques Júnior, que os outros fossem eventualmente presos.
O que está aqui em causa, e me interessa salientar, reporta-se exclusivamente ao comportamento que teve em Moçambique nesse conturbado período de 1974/75.
Dou testemunho da verdade, nua e crua, sem o menor manto diáfano de fantasia. E não há nada mais brutal do que um facto. Aconteceu. É assim, sem tirar nem pôr. Só mentindo com quantos dentes tem, poderá o senhor major-general Lopes Camilo negar a evidência.
Terá sido um caso de dupla personalidade? Um remake do Dr. Jekill and Hyde? O brioso oficial, em noites de luar, transformar-se-ia em lobisomem? Mistério…
É realmente inacreditável que alguém com o perfil de militar impoluto, apresentado pelo próprio na sua carta de 17 de Outubro de 2003, nascido numa boa família, educado, ao que parece, no culto da honra e do dever militar, temente a Deus e devotado à Pátria, possa ter assumido comportamentos e atitudes em tão flagrante contradição com os mesmos princípios e valores que a Família e a Escola lhe haviam, aparentemente, incutido.
Foi apanhado pela voragem tresloucada do PREC em África? Ultrapassado pelos acontecimentos? Ou responsável consciente e determinado da tragédia que foi a “exemplar descolonização”, com o arrastar da bandeira das quinas na lama, pelas ruas da amargura?
Passando por cima das suas declarações acerca da sua carreira militar, como analisas o pouco que diz realmente relacionado com os acontecimentos de 1974, em Lourenço Marques?
O que é que o senhor major-general entende por “nunca ter pertencido a qualquer estrutura organizativa do movimento das forças armadas”? Valha-me Deus! Eu nunca disse que ele tivesse pertencido ao Conselho dos Vinte ou ao Conselho da Revolução. Mas havia outras estruturas menos conhecidas, mais informais, a nível local, que assumiam uma importância bem superior às “inseridas na cadeia hierárquica e funcional existente”.
Era público e notório, em Lourenço Marques, que o então capitão Camilo era, de facto, uma figura proeminente do MFA local e um esteio fundamental da diabólica “aliança MFA/Frelimo”, fizesse ou não parte oficialmente da Comissão Militar Mista. Conheço por aí muita gente que afirma o mesmo.
Oficiais superiores do Exército Português houve que foram vistos “a tiritar de coragem” face aos bravos rapazes do MFA, cujo poder paralelo ao da hierarquia formal constituía esse Novíssimo Príncipe, denunciado pelo Prof. Adriano Moreira; uma estrutura de carácter revolucionário, omnipresente e omnipotente, que controlava tudo e todos. Quem – só para ser desautorizado, desobedecido, saneado ou até preso – corria o risco de desafiar a autoridade dos “homens sem sono” que, de facto, mandavam, sem se preocuparem com as opiniões, as sensibilidades, ou os pruridos das altas patentes do velho Exército?
Que o senhor major-general Lopes Camilo tenha bem presente que à sua volta, em Lourenço Marques, havia muitos militares que observavam e não compartilhavam das suas ideias, muita gente que não sentia nenhuma afinidade com o MFA e muito menos com a Frelimo…
Havia de facto bastantes oficiais que se sentiam incomodados, e até chocados, com as manifestações de amizade e confraternização ao “seu camarada” Jacinto Veloso que, para todos os efeitos, não passa de um desertor das Forças Armadas Portuguesas, um tenente piloto aviador (PQP) da Força Aérea Portuguesa que havia desertado, aterrando com um bombardeiro T-6 na Tanzânia onde fora recebido com braços abertos “pelos seus camaradas da Frelimo”. (Será que também teve direito a alguma comendazita da Ordem da Liberdade, por exemplo). Em suma, um traidor que tinha passado ao Inimigo e se tornara deste modo cúmplice, senão autor directo, da morte de muitos dos nossos soldados.
O senhor major-coronel Lopes Camilo terá de entender que a maioria dos militares portugueses, dos antigos e dos actuais, não compartilham da opinião do meu amigo (sem ironia) major (sem general…) Mário Tomé, quando este defendeu num artigo inserido no Público de 18 de Agosto de 2003 que “houve milhares de desertores do Exército Português, dignos do maior respeito, porque não aceitaram lutar contra a liberdade no exército colonial ao serviço de um estado colonialista e fascista.”
Manténs, portanto, todas as tuas acusações? Que esperas conseguir?
Mantenho o que disse, com toda a minha veemência, até aos finais dos meus dias. Esperar, espero muito pouco. Que o general Lopes Camilo abandone a Direcção da Liga dos Combatentes. A sua permanência na Direcção é um insulto para todos os que se bateram por um Portugal que ele ajudou a destruir.
(Com a devida autorização do Blog Xiconhoca)
Sexta-feira, 22 de Maio de 2009
(...Continuação)
Na sequência do "Post" anterior e, porque, segundo as informações que, diàriamente, me chegam de Moçambique e baseadas em várias fontes , a democracia moçambicana, tal como a conhecemos, poderá estar em perigo, uma vez que a Renamo não tem apresentado projectos mobilizadores para a sociedade moçambicana, muito por falta de uma liderança política efectiva.
Na Renamo, tal como na Frelimo, coexistem várias tendências, cujas fracturas estão mais exposta, dado não ser um partido do Poder, ao contrário da Frelimo que, enquanto poder, vai distribuindo os seu "boys", de forma a mostrar coesão.
Numa situação destas, num mundo em constante mudança e a grande crise que o Mundo está a atravessar, a tendência natural será a de manter o "status quo", do que avançar para grandes mudanças, a não ser que ser que as pessoas se revejam num Projecto Mobilizador, como o protagonizado por Barack Obama, nos EUA.
O Engº. Daviz Simango deverá ter isso em mente e, pelas informações que possuo, o seu projecto está a ter uma grande aceitação na juventude e nas classes mais instruídas.
Para conhecimento de todos, publico o Manifesto Político do MDM, sem qualquer comentário:
MOVIMENTO DEMOCRÁTICO DE MOÇAMBIQUE
(MDM)
MANIFESTO POLÍTICO
O Ano de 2009 poderá representar o ano mais decisivo para a democracia em Moçambique, desde que o nosso País passou a desfrutar de um ambiente multipartidário, de liberdade de expressão, liberdade de imprensa e associação política.
Foi a partir de 1992, na sequência do Acordo Geral de Paz em Roma entre a Frelimo e a Renamo, que a Independência Nacional conquistada em 1975, se converteu num verdadeiro reconhecimento da diversidade de ideias e opções de todos os moçambicanos. Antes disso, prevaleceu um regime que negava a diversidade política e ideológica, a iniciativa privada, a liberdade e a protecção dos bens pessoais e privados dos cidadãos.
Mas o perigo de que o regime mono partidário retorne sob a capa de um sistema multipartidário, é um risco cada vez mais iminente e crescente. Nas três últimas eleições multipartidárias, tanto ao nível autárquico como a nível nacional, as chances de alternância do poder político e da governação, diminuíram progressivamente de eleição para eleição. A consequência disto é que o partido actualmente no poder em Moçambique, governa e reina sem ter que prestar contas à sociedade moçambicana, pois não existe uma oposição politicamente forte e capaz de exercer uma monitoria efectiva e responsabilizadora da governação.
É preciso tomar consciência da situação paradoxal, em que se encontra a participação política dos moçambicanos. Passados mais de trinta anos de independência política, temos que reconhecer a situação humilhante da nossa moçambicanidade; os parceiros internacionais conseguem obter dele maior prestação de contas e responsabilização do Executivo em exercício, do que todas as Instituições Nacionais. Esta lamentável situação pode ainda tornar-se pior se a Frelimo conseguir nas próximas eleições Legislativas e Presidenciais, previstas para o corrente ano, uma vitória idêntica à que conquistou nas eleições Autárquicas de 2008. O risco está à vista. Há que evitá-lo porque as consequências de tal cenário, podem ser fatais para a liberdade que a nossa geração conquistou e da qual Moçambique se tornou referência internacional.
Será que conseguiremos evitar tal perigo? A resposta a esta dúvida começou a ser dada de forma positiva, corajosa e determinada pelas bases da Renamo e milhares de outros moçambicanos, que no dia 28 de Agosto de 2008, se insurgiram contra a iminente capitulação e derrota que os munícipes da Beira iriam sofrer. Era claramente previsível que se aqueles moçambicanos, da segunda maior cidade de Moçambique, se tivessem resignado ao caminho apontado pela actual liderança do principal partido da oposição, com acento na Assembleia da República, o poder teria sido conquistado pela Frelimo.
Este acto de afirmação e determinação política, constitui hoje a principal referência do valor da esperança e da consciência pró-activa e organizativa. O movimento da Beira nas recentes eleições autárquicas, converteu-se num movimento renovador, unificador e determinado, porque mostrou capacidade organizacional e mobilizador, na defesa de uma opção alternativa, contra as manobras impostas pelos dois maiores partidos políticos em Moçambique.
O ano de 2009 será decisivo para a democracia em Moçambique, porque de novo, mas agora a nível nacional, a maioria dos moçambicanos irão confrontar-se com o risco de capitulação da sua cidadania.
Comício de Daviz Simango (O Obama do Chiveve)
É neste contexto que surge o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), cujo objectivo mais imediato é preparar, organizar e mobilizar os moçambicanos, preocupados com o futuro da nossa jovem democracia, para impedir que a Frelimo conquiste nas eleições Provinciais e Legislativas, a maioria qualificada que tanto ambiciona; isto é, evitar que a Frelimo obtenha mais de dois terços de deputados na Assembleia da República, os quais validariam a efectivação de um novo mono partidarismo real, disfarçado de multipartidário. A consequência de tal situação são enormes, como por exemplo, a possibilidade de a Frelimo vir a tentar alterar a Constituição a seu belo prazer, para assegurar um outro mandato para o actual Presidente da República.
É preciso sermos realistas. Neste momento, nenhuma força política existente em Moçambique tem condições organizativas de mobilização e liderança, para assumir com sucesso a tarefa que o MDM se propõe realizar. Se o MDM vencer este objectivo imediato, certamente transformar-se-á numa plataforma política importante, para que os moçambicanos encontrem nele, a alternativa indispensável à realização de opções e escolhas que os partidos na oposição actualmente não proporcionam.
Construir um projecto político e social alternativo para Moçambique e para todos os moçambicanos, exige de cada um de nós, um enorme empenho e responsabilização individual e colectiva. Exige também conceber e construir instituições políticas e económicas mais justas, adequadas e eficazes, para uma maior estabilidade e sustentabilidade do desenvolvimento de Moçambique.
O MDM acredita que a Democracia deve ser o destino de Moçambique, pois foi este o caminho que a grande maioria dos moçambicanos escolheu seguir. Mas para isso, a liberdade e a igualdade de condições entre os moçambicanos, consubstanciados no respeito pela diferença e no estímulo à criatividade individual, devem constituir-se nos alicerces fundamentais, sem os quais a democracia, o Estado de Direito, o desenvolvimento humano e a justiça social, podem de facto florescer.
Daviz Simango não é um "chefe", mas um Líder
Estes factores devem ser devidamente valorizados pelos governantes e pelas classes políticas do País. Só assim se poderão criar sinergias para um rápido, efectivo e duradouro desenvolvimento de Moçambique.
Tal como o sol brilha para todos, o MDM tudo fará para que todos os moçambicanos sejam beneficiários das conquistas da Independência de 1975 e da Democracia de 1992. O MDM nasce para contribuir para uma paz duradoura e crescimento económico sustentável, sem exclusão e/ou discriminação com base na etnia, raça, religião, opção político/partidária ou região geográfica.
Moçambique pode ser um lugar melhor para todos os que nele nascem e vivem. Urge, portanto, que nos unamos em torno do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), cuja proposta de programa de acção oferece uma Agenda Política alternativa, realista e construtiva, em que os seus objectivos, prioridades e estratégias conduzirão seguramente a uma alternância progressiva e dignificadora, no actual quadro político, social e económico de Moçambique.
Beira, 07 de Março de 2009
Sábado, 16 de Maio de 2009
Conforme é do conhecimento público, este é um BLOG PESSOAL, pelo que todos os artigos de opinião são da responsabilidade do seu autor e nada têm a ver com as organizações de que faz parte.
Eu, pessoalmente, apoio o MDM (Movimento Democrático de Moçambique), porque penso estar aqui a alavanca para a transformação de Moçambique num país democrático, livre, justo e solidário. Tenho a consciência de que uma árvore não faz a floresta, mas muitas árvores, como esta, podem formar uma floresta maravilhosa.
Passados 34 anos sobre a independência de Moçambique, tempo que ultrapassa uma geração, este país maravilhoso continua na retaguarda do desenvolvimento e a ser um dos países mais pobres do Mundo, por obra e graça da Frelimo. Isto é, o modelo da FRELIMO esgotou-se na altura em que lhe foi entregue, de forma anómala, o poder. O novo Moçambique, tãoapregoado na Guerra de Libertação, acabou aí. Os “Campos de Extermínio”, as deportações, em massa, de populações, o enriquecimento fácil dos seus dirigentes, etc., serão só, para a história, os factos marcantes do regime frelimista. Do seu governo nada se aproveita. De nada servem as intervenções de Graça Machel em defesa do Samora, porque, como esposa e como ministra, tinha a obrigação de conhecer as actividades criminosas da Frelimo e, que eu saiba, nunca as denunciou.
Posto isto, acho que os movimentos provenientes da luta armada, pese, embora, o facto do papel relevante da RENAMO na sua luta contra a ditadura, deveriam abandonar o carácter frentista das suas organizações e transformarem-se em Partidos Políticos, baseados nos ideais que defendem, a fim de possibilitarem aos eleitores votarem no que, no seu entender, considerarem o melhor para o seu País. Os modelos “frentistas”,
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Daviz Simango, à frente do Pai (Cairo - 1973) | Daviz Simango - Edil da Beira |
historicamente, evoluíram para regimes de partido único, com os resultados nefastos que todos conhecem, como, por exemplo, o Movimento Bolchevique, na Rússia. O “frentismo” integra tudo: políticos de extrema-esquerda, de esquerda, de direita, de extrema-direita, do centro, oportunistas, vigaristas, criminosos, proxenetas, etc., etc., isto é, engloba tudo e, dentro desse saco de gatos, tudo se confunde, os interesses pessoais prevalecem e o povo continua esquecido, razão pela qual, em 34 anos de “desgoverno” da Frelimo, um País, potencialmente rico, se transformou num dos mais pobres do Mundo.
É bom lembrar que a democracia não se esgota no voto, que só serve para legitimar o poder que os cidadãos escolheram. A democracia exerce-se no dia-a-dia, como o ar que se respira.
O M.D.M. estará a construir as bases da mudança, liderado por um Homem, Daviz Simango, cujo apelido dispensa qualquer comentário (os seus pais foram vítimas do regime criminoso do Samora Machel, apesar da sua luta contra o regime colonialista), que poderá apresentar ao Povo de Moçambique outras soluções, para além das que lhe foram impostas, e que passam pela Reconciliação Nacional, pela Liberdade, pela Paz, pela Justiça e pela Solidariedade.
Aproveito convidar os visitantes deste Blog a lerem o artigo da autoria da jornalista Clara Ferreira Alves:
por Clara Ferreira Alves
Eis parte do enigma. Mário Soares, num dos momentos de lucidez que ainda vai tendo, veio chamar a atenção do Governo, na última semana, para a voz da rua.
Leia o artigo no seguinte endereço (vale a pena ler):
(Continua …)
Sábado, 9 de Maio de 2009
Conforme referi em artigos anteriores, estive em Olivença pouco mais de seis meses, durante os quais nunca tive qualquer contacto com guerrilheiros da Frelimo, pelo que as minhas conclusões poderão não ser, completamente, objectivas, mas são, contudo, o fruto da minha experiência, enquanto lá estive:
1 – A nossa formação militar era extremamente deficiente, uma vez que nos era dada por Cabos ou Furriéis Milicianos, sem qualquer experiência em “teatros de operações”, pelo que de pouco nos servia a “Especialidade”, em Tavira. Os monitores deliciavam-se mais com os nossos “banhos” nas salinas, do que, propriamente, na instrução de combate anti-guerrilha, coisa que os instrutores desconheciam por completo (o comandante da minha companhia, em Tavira, capitão Falcão, gozava com as “carecadas” que aplicava e nunca o vi a dar instrução militar. Comandava pelo terror.);
2 – Conforme se pode ver no mapa, o Aquartelamento de Olivença constituía a posição mais avançada, a cerca de 30 quilómetros da fronteira com a Tanzânia e muito distanciada dos nossos postos de defesa mais próximos, Pauíla e Cóbue, pelo que nada impedia a infiltração dos abastecimentos da Frelimo aos seus guerrilheiros infiltrados no interior de Moçambique e evitar o contacto com as Nossas Tropas, a fim de não sofrerem baixas desnecessárias;
As setas a vermelho indicam as zonas de infiltração
3 – A Sul de Olivença não existia qualquer Aquartelamento, pelo que não foi difícil à Frelimo mostrar aos observadores internacionais aquilo a que chamava “Áreas Libertadas”, quando, na realidade, eram zonas despovoadas, tal como era quase todo o Niassa. Tive ocasião de verificar, nas diversas vezes que sobrevoei aquela zona, a ausência de quaisquer aglomerados populacionais ou, a existirem, estavam bem camuflados;
4 – Olivença estava, assim, completamente isolada e as armas de defesa do Aquartelamento eram poucas e de eficácia duvidosa, em caso de ataque, em massa, pela Frelimo. As operações no mato obrigavam a percorrer distâncias enormes até às zonas de infiltração e as nossas movimentações eram, facilmente, detectadas pela Frelimo, pelo que, para os seus guerrilheiros, não constituíamos qualquer perigo, porque tinham uma vasta área para se movimentarem. Outro constrangimento era a travessia do Rio Messinge, feita de bote de borracha o que constituía um outro perigo, já que era feita, sempre, no mesmo local e que poderia ser aproveitada pelos guerrilheiros da Frelimo, para provocar sérios danos às Nossas Tropas;
5 – Nestas circunstâncias, a única forma possível, seria o transporte aéreo das Nossas Tropas para as zonas de intervenção o que, além de constituir uma posição de força perante o inimigo, permitiria cair-lhes em cima, quando menos esperassem. Esta era a táctica das milícias do Daniel Roxo que eram transportadas em helicópteros, com eficácia que daí resultava;
Foto tirada no nosso "aeroporto", com a "aerogare" ao fundo
6 – Todos tínhamos a noção das limitações materiais das nossas Forças Armadas, especialmente, na Força Aérea e no Exército, que lutavam com falta de meios e com militares pouco instruídos para a luta de guerrilha e a inexistente preparação psicológica nas fases iniciais da carreira militar que ajudassem a diminuir os traumas que a Guerra Colonial provocavam na população portuguesa;
7 – Em reforço do que acima referi, relativamente à inadequada preparação militar, que nos era ministrada nos tempos de Recruta e Especialidade, apresento o caso dos Grupos Especiais, que eram preparados, nas diversas áreas, por graduados com experiência de combate e que, por e esse motivo, eram considerados autênticas “Máquinas de Guerra”;
8 – Poder-se-á argumentar que, passados 35 anos, é fácil chegar a estas conclusões, mas não nos podemos esquecer que as nossas Forças Armadas eram comandadas por Generais que deveriam saber o terreno que pisavam, conhecer a experiência dos EUA na Guerra do Vietname e, fundamentalmente, as movimentações geopolíticas da URSS e da China e as suas influências nos chamados “Movimentos de Libertação”;
9 – A nossa situação interna, também, não ajudava nada, dada a doutrina do regime ser: “Uma nação de Lisboa até Timor”. Por este motivo, morreram muitos dos nossos militares, sem que o regime ditatorial mudasse uma vírgula no seu discurso oficial e sem que, em devido tempo, iniciasse um verdadeiro Processo de Autodeterminação, como preparação para a Independência;
10 – Por último, quero lembrar que, em Olivença, os nossos militares, sempre, conviveram muito bem com a população e havia colaboração mútua. Nunca nos portamos como uma “força de ocupação” e nunca se cometeram quaisquer sevícias contra os seus habitantes, que nos consideravam uma força de protecção contra aquilo a que eles chamavam “bandidos”. O povo de Olivença não estava com a Frelimo.
A "queca" do Boticas. O Noronha, Eu e o Oliveira
Desta forma, dou por terminado o trabalho sobre o tempo que passei em Olivença, muito embora, fiquem por relatar pequenos factos sobre a nossa vida no Aquartelamento, tais como as noites passadas no nosso “parrô” a cantar ao som da viola do alferes Oliveira ou forma como conseguimos que “Boticas” conseguisse dar uma “queca” com uma cadela mais alta do que ele.
Estou à espera que me enviem, de Moçambique, uma fotografia da actual Olivença. Logo que a receba, publicá-la-ei neste Blog.
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Quarta-feira, 6 de Maio de 2009
Não era minha intenção continuar com o tema da “Descolonização Óptima”, na concepção do Dr. Mário Soares, mas sou obrigado a isso, porque há documentos e posições fundamentais, para que possamos concluir que o Processo de Descolonização de Moçambique foi feito de uma forma atabalhoada, apressada e que não teve em conta a estratégia delineada pelos comunistas, para entregarem este País à esfera de influência do Bloco Soviético e, seguidamente, ao Bloco Chinês.
Eu tinha a noção, já na altura da Guerra Colonial, de que a independência das Colónias Portuguesas era inevitável, mas, também, tinha a noção do interesse do Comunismo Internacional nestes novos países.
Eu faço estas afirmações, com base na formação que recebi, enquanto estudei num Seminário Missionário, cuja congregação tinha Missões em Moçambique.
Nesse Seminário tínhamos uma Biblioteca bastante completa, com muitas obras incluídas no famoso “Índex”do regime fascista, o que as tornava mais apetecíveis (Sartre, Camus, Virgil Georgiu, entre muitos outros).
Tive, como professor, o famoso padre anti-colonialista Joaquim Sampaio, que, também foi professor no Seminário da Namaacha e um grande conhecedor da realidade moçambicana. Como se pode deduzir, eu, politicamente, não estava no grau 0, muito embora, não tivesse qualquer simpatia partidária, dada a minha pouca idade (17 anos).
Fui militar, servi com a devida honra, as Forças Armadas Portuguesas, embora com a consciência de que aquela guerra não era minha.
Depois desta breve introdução, quero revelar dois documentos fundamentais para o Processo de Descolonização, ficando a faltar um documento que é o “Acordo Militar”, complemento do Acordo de Lusaka.
Em primeiro lugar, vou referir o documento apresentado a Marcelo Caetano, em 1973, elaborado pelo, então, Presidente da Zâmbia, Keneth Kaunda. O seu portador foi o Engº. Jorge Jardim, que gozava de grande influência junto do Governo Português, do Malawi e da Zâmbia.
Este documento só seguiu para Lisboa, após o acordo que Keneth Kaunda conseguiu junto da Frelimo, da Coremo e de opositores, não guerrilheiros, ao regime colonialista.
O que se sabe é que Marcelo Caetano o recebeu e considerou uma boa base de partida, mas não houve qualquer evolução, porque, passados seis meses, após a elaboração do documento, aconteceu a Revolução de 25 de Abril.
Este documento não servia, em nada, os interesses do Partido Comunista nem dos seus simpatizantes no interior das nossas Forças Armadas.
Só não entendo por que razão é que políticos portugueses chefiados pelo Dr. Mário Soares, não comunistas, tivessem feito tábua-rasa deste documento e não o tomaram, como base, para um verdadeiro Processo de Descolonização, quando Keneth Kaunda já tinha feito o trabalho principal. É claro que entendo, a submissão ao PCP era total.
Deixo à consideração de todos, os documentos a que me referi:
«Confidencial»
República da Zâmbia
Memorandum
Ponto de vista da Zâmbia na Evolução dos Territórios Africanos Portugueses
Estrutura para a Independência
O Governo Português está obviamente preocupado acerca da preservação dos seus interesses nacionais nos territórios africanos de Portugal. Deve “inter alia” preocupar-se com o tipo de ligações que permitiriam a Portugal manter a sua influência nos novos territórios independentes. O Governo da Zâmbia tem a consciência desta preocupação e está portanto procurando colaborar na preparação de uma estrutura que proteja e garanta os interesses portugueses. O Governo da Zâmbia está preparado, desde que tenha o acordo do lado português, para obter as garantias dos dirigentes nacionalistas acerca do futuro dos interesses de Portugal. Com este objectivo deve ser considerado o seguinte:
1. RELAÇÕES POLÍTICAS
a) Os territórios independentes prosseguirão uma tendência não-racial na construção das novas nações e os nacionais portugueses que ali têm vivido há séculos encontrarão uma melhor situação do que aquela que têm agora.
b) A segurança dos nacionais portugueses apenas pode ser apropriadamente garantida através de um programa de integração nacional sob condições de harmonia racial e cooperação, sem conflito ou guerra. A actual guerra é um obstáculo para se alcançarem estes objectivos.
c) As relações diplomáticas entre os novos territórios independentes e Portugal assegurarão contactos mais efectivos e produtivos, bem como mútuo apoio na base de igualdade e respeito recíprocos.
d) Estabelecimento de uma Comunidade Lusíada compreendendo os antigos territórios portugueses incluindo o Brasil. Uma associação destas, na qual Portugal teria uma posição dominante, desenvolver-se-ia como melhor organização do que a «Commonwealth» que a Grã-Bretanha instaurou. A política britânica-rodesiana-sul-africana conjuntamente com a visão racista de alguns nacionais britânicos nas antigas colónias britânicas ensombraram a imagem da Grã-Bretanha e reduziram a sua influência, sobretudo em África.
e) A Administração nos novos territórios independentes será grandemente influenciada por Portugal no futuro previsível. Durante este período os nacionais portugueses serão capazes de criar um maior grau de confiança na governação das novas nações independentes agora sob controlo português.
2. RELAÇÕES CULTURAIS
O Governo da Zâmbia está ciente do orgulho português na sua cultura Lusíada. É convicção do Governo da Zâmbia de que a independência dos territórios africanos portugueses não significará o fim da influência cultural portuguesa, mas ao contrário o início da expansão do campo da cultura lusa em dignidade e respeito.
a) O português permanecerá como a Língua Franca nos novos territórios independentes.
b) A educação será predominantemente portuguesa com professores portugueses.
c) Cooperação técnica com experiência e pessoal portugueses.
d) A influência portuguesa na vida social e cultural permanecerá durante longo tempo.
e) As condições religiosas serão influenciadas pelo passado português.
3. RELAÇÕES ECONÓMICAS
A conservação dos interesses económicos portugueses é fundamental em qualquer acordo para conceder a independência aos territórios africanos portugueses. O Governo da Zâmbia está ciente de que qualquer estrutura para a independência deveria garantir ao Governo Português que os seus interesses económicos serão protegidos.
a) Comércio
b) Investimentos
c) Assistência técnica
d) Acordo económico e de cooperação técnica.
4. RELAÇÕES MILITARES
O Governo da Zâmbia reconhece que a Defesa é um campo muito melindroso. O Governo Português quererá, sem dúvida, estar seguro de que a independência política não conduzirá, por exemplo, a que uma potência comunista preencha o vácuo. A preservação dos territórios portugueses será assunto de interesse para o Ocidente em geral. Segundo o Governo da Zâmbia estes aspectos são negociáveis com os dirigentes nacionalistas e não serão um obstáculo para um acordo final sobre a independência.
5. OPORTUNIDADE PARA A INDEPENDÊNCIA
Deve ser negociada logo que a estrutura para a independência esteja traçada.
6. FACTORES EXTERNOS QUE DEVEM SER ARREDADOS DA SITUAÇÃO PORTUGUESA
1. Envolvimento da África do Sul.
2. Envolvimento da Rodésia.
3. Envolvimento das grandes potências.
Estes podem complicar as negociações ou as medidas tomadas para pôr fim à guerra.
Interesses Nacionais Portugueses
1. INTERESSES POLÍTICOS E DE SEGURANÇA
Fundamentalmente referimo-nos ao bem-estar dos nacionais portugueses na era post-independência. O novo sistema político para os novos países independentes deverá assegurar protecção para todos os moçambicanos e promover o seu bem-estar sem consideração de raça, cor, credo ou origem étnica. De particular importância para o Governo Português é o futuro de uma grande população de origem portuguesa.
2. INFLUÊNCIA POLÍTICA
Portugal deseja, sem dúvida, ter uma influência dominante nos novos países independentes e não desejaria ver o crescimento de qualquer outra influência prejudicial para os interesses portugueses nos seus antigos territórios.
3. INTERESSES ECONÓMICOS E FINANCEIROS
Portugal desejaria, sem dúvida, ver que o comércio, os investimentos e outros interesses económicos sejam completamente desenvolvidos nos seus antigos territórios em seu favor e não em favor de qualquer outra potência.
4. INTERESSES CULTURAIS
Conservação da cultura lusa.
5. DEFESA
Os novos países independentes deveriam, no ponto de vista do Governo Português, manter uma atitude quanto à defesa que pelo menos não fosse anti-portuguesa. A estrutura para a conservação e progresso de todos estes interesses nacionais é, no conhecimento da Zâmbia, negociável. Os chefes nacionalistas estão determinados por um sentimento de responsabilidade moral para com Portugal e os seus interesses, e estariam preparados para encontrar uma solução amigável em todos estes aspectos.
Lusaka, 12 de Setembro de 1973.»
**********
O ACORDO DE LUSAKA
Reunidas em Lisboa de 5 a 7 de Setembro de 1974 as delegações da Frente de Libertação de Moçambique e do Estado Português, com vista ao estabelecimento do acordo conducente à independência de Moçambique, acordaram nos seguintes pontos:
1. O Estado Português, tendo reconhecido o direito do povo de Moçambique à independência, aceita por acordo com a FRELIMO a transferência progressiva dos poderes que detém sobre o território nos termos a seguir enunciados.
2. A independência completa de Moçambique será solenemente proclamada em 25 de Junho de 1975, dia do aniversário da fundação da FRELIMO.
3. Com vista a assegurar a referida transferência de poderes são criadas as seguintes estruturas governativas, que funcionarão durante o período de transição que se inicia com a assinatura do presente Acordo:
a) Um Alto-Comissário de nomeação do Presidente da República Portuguesa;
b) Um Governo de Transição nomeado por acordo entre a Frente de Libertação de Moçambique e o Estado Português;
c) Uma Comissão Militar Mista nomeada por acordo entre o Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique.
4. Ao Alto-Comissário, em representação da soberania portuguesa, compete:
a) Representar o Presidente da República Portuguesa e o Governo Português;
b) Assegurar a integridade territorial de Moçambique;
c) Promulgar os decretos-lei aprovados pelo Governo de Transição e ratificar aos actos que envolvam responsabilidade directa para o Estado Português;
d) Assegurar o cumprimento dos acordos celebrados entre o Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique e o respeito das garantias mutuamente dadas, nomeadamente as consignadas na Declaração Universal dos Direitos do Homem;
e) Dinamizar o processo de descolonização.
5. Ao Governo de Transição caberá promover a transferência progressiva de poderes a todos os níveis e a preparação da independência de Moçambique.
Compete-lhe, nomeadamente:
a) O exercício das funções legislativa e executiva relativas ao território de Moçambique. A função legislativa será exercida por meio de decretos-lei;
b) A administração geral do território até à proclamação da independência e a reestruturação dos respectivos quadros;
c) A defesa e salvaguarda da ordem pública e da segurança das pessoas e bens;
d) A execução dos acordos entre a Frente de Libertação de Moçambique e o Estado Português;
e) A gestão económica e financeira do território, estabelecendo nomeadamente as estruturas e os mecanismos de controlo que contribuam para o desenvolvimento de uma economia moçambicana independente;
f) A garantia do princípio da não discriminação racial, étnica, religiosa ou com base no sexo;
g) A reestruturação da organização judiciária do território.
6. O Governo de Transição será constituído por:
a) Um Primeiro-Ministro nomeado pela Frente de Libertação de Moçambique, a quem compete coordenar a acção do governo e representá-lo.
b) Nove Ministros, repartidos pelas seguintes pastas: Administração Interna; Justiça; Coordenação Económica; Informação; Educação e Cultura; Comunicações e Transportes; Saúde e Assuntos Sociais; Trabalho; Obras Públicas e Habitação;
c) Secretários e Subsecretários a criar e nomear sob proposta do Primeiro-Ministro, por deliberação do Governo de Transição, ratificada pelo Alto-Comissário;
d) O Governo de Transição definirá a repartição da respectiva competência pelos Ministros, Secretários e Subsecretários.
7. Tendo em conta o carácter transitório desta fase da acção governativa os Ministros serão nomeados pela Frente de Libertação de Moçambique e pelo Alto-Comissário na proporção de dois terços e um terço respectivamente.
8. A Comissão Militar Mista será constituída por igual número de representantes das Forças Armadas do Estado Português e da Frente de Libertação de Moçambique e terá como missão principal o controle da execução do acordo de cessar-fogo.
9. A Frente de Libertação de Moçambique e o Estado Português pelo presente instrumento acordam em cessar-fogo às zero horas do dia 8 de Setembro de 1974 (hora de Moçambique) nos termos do protocolo anexo.
10. Em caso de grave perturbação da ordem pública, que requeira a intervenção das Forças Armadas, o comando e coordenação serão assegurados pelo Alto-Comissário, assistido pelo Primeiro-Ministro, de quem dependem directamente as Forças Armadas da Frente de Libertação de Moçambique.
11. O Governo de Transição criará um corpo de polícia encarregado de assegurar a manutenção da ordem e a segurança das pessoas. Até à entrada em funcionamento desse corpo o comando das forças policiais actualmente existentes dependerá do Alto-Comissário de acordo com a orientação geral definida pelo Governo de Transição.
12. O Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique comprometem-se a agir conjuntamente em defesa da Integridade do território de Moçambique contra qualquer agressão.
13. A Frente de Libertação de Moçambique e o Estado Português afirmam solenemente o seu propósito de estabelecer e desenvolver laços de amizade e cooperação construtiva entre os respectivos povos, nomeadamente nos domínios culturais, técnico, económico e financeiro, numa base de independência, igualdade, comunhão de interesses e respeito da personalidade de cada povo.
Para o efeito serão constituídas durante o período de transição comissões especializadas mistas e ulteriormente celebrados os pertinentes acordos.
14. A Frente de Libertação de Moçambique declara-se disposta a aceitar a responsabilidade decorrente dos compromissos financeiros assumidos pelo Estado Português em nome de Moçambique desde que tenham sido assumidos no efectivo interesse deste território.
15. O Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique comprometem-se a agir concertadamente para eliminar todas as sequelas de colonialismo e criar uma verdadeira harmonia racial. A este propósito, a Frente de Libertação de Moçambique reafirma a sua política de não discriminação, segundo a qual a qualidade de Moçambicano não se define pela cor da pele, mas pela identificação voluntária com as aspirações da Nação Moçambicana. Por outro lado, acordos especiais regularão numa base de reciprocidade o estatuto dos cidadãos portugueses residentes em Moçambique e dos cidadãos moçambicanos residentes em Portugal.
16. A fim de assegurar ao Governo de Transição meios de realizar uma política financeira independente será criado em Moçambique um Banco Central, que terá também funções de banco emissor. Para a realização desse objectivo o Estado Português compromete-se a transferir para aquele Banco as atribuições, o activo e o passivo do departamento de Moçambique do Banco Nacional Ultramarino. Uma comissão mista entrará imediatamente em funções, a fim de estudar as condições dessa transferência.
17. O Governo de Transição procurará obter junto de organizações internacionais ou no quadro de relações bilaterais a ajuda necessária ao desenvolvimento de Moçambique, nomeadamente a solução dos seus problemas urgentes.
18. O Estado Moçambicano independente exercerá integralmente a soberania plena e completa no plano interior e exterior, estabelecendo as instituições políticas e escolhendo livremente o regime político e social que considerar mais adequado aos interesses do seu povo.
19. O Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique felicitam-se pela conclusão do presente Acordo, que, com o fim da guerra e o restabelecimento da paz com vista à independência de Moçambique, abre uma nova página na história das relações entre os dois países e povos. A Frente de Libertação de Moçambique, que no seu combate sempre soube distinguir o deposto regime colonialista do povo português, e o Estado Português desenvolverão os seus esforços a fim de lançar as bases de uma cooperação fecunda, fraterna e harmoniosa entre Portugal e Moçambique.
Lusaka, 7 de Setembro de 1974.
Pela Frente de Libertação de Moçambique:
Samora Moisés Machel (Presidente).·
Pelo Estado Português:
Ernesto Augusto Melo Antunes (Ministro sem Pasta).
Mário Soares (Ministro dos Negócios Estrangeiros).
António de Almeida Santos (Ministro da Coordenação Interterritorial).
Victor Manuel Trigueiros Crespo (conselheiro de Estado).
Antero Sobral (Secretário do Trabalho e Segurança Social do Governo Provisório de Moçambique).
Nuno Alexandre Lousada (tenente-coronel de infantaria).
Vasco Fernando Leote de Almeida e Costa (capitão-tenente da Armada).
Luís António de Moura Casanova Ferreira (major de infantaria).
Aprovado, depois de ouvidos a Junta de Salvação Nacional, o Conselho de Estado e o Governo Provisório, nos termos do artigo 3.° da Lei n.º 7/74, de 27 de Julho.
9 de Setembro de 1974.
Publique-se.
O Presidente da República, António de Spínola.
(1) Publicado no Diário do Governo, I Série, n.º 210, de 9 de Setembro de 1974.
Este é o Acordo de Lusaka. Agora reparem na forma como foi cumprido em todos os seus pressupostos. Repare-se que este “Acordo” foi feito só com a Frelimo, que representava uma pequena minoria, em Moçambique, e que excluiu os muitos milhões de Moçambicanos que não se reviam no terrorismo da Frelimo, com a agravante de que este movimento terrorista ficou com direito de designar o Primeiro-ministro e dois terços de Ministros.
Isto não foi um acordo, mas uma capitulação, sem honra nem glória e constituiu um atentado à memória de todos aqueles que perderam a vida ao serviço das nossas Forças Armadas. Nem essa memória ficou ressalvada, como se pode verificar pelas imagens, que nos são apresentadas, das sepulturas dos nossos mortos na Guerra Colonial.
Por último, será interessante referir que a pasta da Administração Interna foi entregue ao torcionário e, hoje, Presidente da República de Moçambique, Armando Guebuza.
Que os seus mortos o chamem, o mais depressa possível, para junto de si.
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Para demonstrar a “Óptima Descolonização”, leiam a carta que Vice-Almirante, Rosa Coutinho, Alto-Comissário em Angola, nomeado pelo Conselho da Revolução, enviou ao Agostinho Neto, seu cunhado, relativamente ao processo de descolonização daquela Colónia:
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Luanda aos 22 de Dezembro de 1974
Camarada Agostinho Neto
A FNLA e a UNITA insistem na minha subsituação por um reaccionário que lhes apare o jogo, o que a concretizar-se seria o desmoronamento do que arquitectamos no sentido de entregar o poder unicamente ao MPLA.
Apoiam-se aqueles movimentos fantoches em brancos que pretendem perpetuar o execrando colonialismo e imperialismo português - O tal da Fé e do Império, o que é o mesmo que dizer do Bafio da Sacristia e da Exploração do Papa e dos Plutocratas.
Pretendem essas forças imperialistas contrariar os nossos acordos secretos de Praga, que o camarada Cunhal assinou em nome do PCP, afim de que sob a égide do glorioso PC da URSS possamos estender o comunismo de Tânger ao Cabo e de Lisboa a Washington.
A implantação do MPLA em Angola é vital para apearmos o canalha MOBUTU, lacaio do imperialismo e nos apoderarmos da plataforma do Zaire.
Após a última reunião secreta que tivemos com os camaradas do PCP, resolvemos aconselhar-vos a dar execução imediata à segunda fase do plano. Não dizia Fanon que o complexo de inferioridade só se vence matando o colonizador? Camarada Agostinho Neto, dá, por isso, instruções secretas aos militantes do MPLA para aterrorizarem por todos os meios os brancos, matando, pilhando e incendiando, a fim de provocar a sua demanda de Angola. Sede cruéis sobretudo com as crianças, as mulheres e os velhos para desanimar os mais corajosos. Tão arreigados estão à Terra esses cães exploradores brancos que só o terror os fará fugir. O FNLA e a UNITA deixarão assim de contar com o apoio dos brancos, de seus capitais e da sua experiencia militar.
Desenraízem-nos de tal maneira que com a queda dos brancos se arruíne toda a estrutura capitalista e se possa instaurar a nova sociedade socialista ou pelo menos se dificulte a reconstrução daquela.
Saudações revolucionárias. A Vitoria é certa.
Assinatura
António Alva Rosa Coutinho
Vice-Almirante
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Perante isto, só deveria restar, pelo menos, um pouco de vergonha e decência aos “Descolonizadores” e pedirem desculpa aos portugueses, angolanos e moçambicanos pelas atrocidades que autorizaram e considerarem esta situação como um crime de “Alta Traição” e de CRIME CONTRA A HUNIDADE.
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Sábado, 2 de Maio de 2009
Hoje, resolvi escrever um pouco sobre o processo da “descolonização exemplar” de Moçambique.
A razão é muito simples: ouvi, poucos dias antes das comemorações dos 35 anos da Revolução Abril, o Dr. Mário Soares afirmar, numa conferência, que a nossa “descolonização” foi óptima. A tolerância tem limites, apesar da sua idade.
Vou socorrer-me de um parágrafo da Wikipédia, sobre o assunto, e que passo a citar:
“Polémica sobre a descolonização das ex-colónias portuguesas na África
Algumas pessoas, tanto em Portugal, como nas suas ex-colónias de África, consideram que o processo de descolonização foi mal conduzido.
Um dos argumentos é fato de não terem sido incluídos nos acordos que levaram à independência das colónias garantias sobre os direitos dos residentes que ali viviam e que viriam a escolher a nacionalidade portuguesa; esses críticos justificam o êxodo dos portugueses por essa razão.
No entanto, os problemas que viveram, a seguir às suas independências principalmente Angola e Moçambique, são, geralmente, atribuídos a questões internas de governação e não ao processo de descolonização.”
Cito, também, na íntegra, o parágrafo do Programa do MFA, relativamente ao problema colonial:
“8 – A política ultramarina do Governo Provisório, tendo em atenção que a sua definição competirá à Nação, orientar-se-á pelos seguintes princípios:
a) Reconhecimento de que a solução das guerras no ultramar é política, e não militar;
b) Criação de condições para um diálogo franco e aberto, a nível nacional, do problema ultramarino;
c) Lançamento dos fundamentos de uma política ultramarina que conduza à paz.
Eu acrescento, não são só algumas pessoas que dizem que processo de descolonização foi mal conduzido, mas sim, a grande maioria dos portugueses.
Se o Dr. Mário Soares tivesse afirmado que tinha sido, naquelas circunstâncias, a forma possível, apesar de, mesmo assim, ser contestável, estaria mais próximo da realidade.
A minha opinião é que a “descolonização” foi feita desta forma devido à imposição dos comunistas, muito bem estruturados, e que tinham o poder de condicionar toda a actividade política, em Portugal, dada a falta de preparação política de todos os outros, nos quais incluo Mário Soares e Almeida Santos, que, com Melo Antunes e Otelo Saraiva de Carvalho, “negociaram” a independência de Moçambique, num acordo que foi, apenas, uma “capitulação” perante o Comunismo Internacional da época, representado pela antiga União Soviética e pela China.
Penso que o processo de descolonização chegou com um atraso de 15 a 20 anos, mas, também, acredito que os nossos governantes da altura, não se socorreram de todos os meios ao seu dispor, nomeadamente, o Conselho de Segurança da ONU, para que o processo tivesse um rumo diferente.
Estes “negociadores” não sabiam rigorosamente nada do que se passava no terreno e reconhecer a Frelimo, que só se representava a si (menos de 20 % da população moçambicana) como único interlocutor, foi um erro crasso e que contribuiu para uma longa guerra civil em Moçambique.
A própria liderança e o rumo seguido por Samora Machel começaram a ser contestados pela União Soviética, considerando que as suas práticas eram estalinistas e que já tinham sido banidas pela própria URSS.
O que se passou a seguir foi algo de terrível. A deslocação de populações, a prisão de pessoas que professavam religiões (Samora Machel era ateu), de opositores da Frelimo, mesmo antes de tomar o poder, as suas condenações à morte, em julgamentos fantoches em Nachingwea e as suas execuções em “campos de concentração” no Niassa, Cabo Delgado e Zambézia e cujos segredos continuam bem guardados pelos actuais dirigentes da Frelimo que estão no poder ou no caciquismo das cidades e aldeias.
Mas, como diz Carlyle, são os oportunistas de toda a espécie que se aproveitam das revoluções. Os autores dos crimes continuam, intocáveis, no poder e os “negociadores”, excepto o falecido Melo Antunes, vivem faustosamente sem que esta realidade os incomode; “a nossa descolonização foi óptima”, dizem eles.
A verdade é que foram criados outros países, mas que continuam como sendo dos mais pobres do mundo e não há CPLP que lhes valha. As independências vieram como a chuva no Inverno e só não foi concedida a independência à Madeira e aos Açores, porque ninguém se lembrou, na altura, de criar movimentos de libertação nestes dois arquipélagos. Recordo-me de um “slogan” anarca, nessa época, e que fez furor: “Independência para as Berlengas, já!” ou, então este:"Nem mais um faroleiro para as Berlengas".
Para todos ficarem com uma ideia sobre a personalidade do criminoso Samora Machel, leiam o que diz, acerca dele, o primeiro embaixador da União Soviética em Moçambique:
Samora Machel foi um verdadeiro ditador como Estaline em maus-tratos à população portuguesa
Embora essa vergonhosa atitude, própria de extremista complexado e repleto de ódio racial não seja novidade para o mundo, transcrevo porque penalizou injustamente vidas e o futuro de milhares de moçambicanos de todas as cores e origens e um País chamado Moçambique, que ainda hoje se ressente económica e socialmente dessa verdadeira, insana e irresponsável loucura.
Afinal quem não lembra, naquela época tremenda de 74/75, os aeroportos moçambicanos repletos de famílias luso-moçambicanas que, assustadas e ameaçadas a cada discurso demagogo e populista desse senhor, abandonavam todos os seus bens fruto de muito trabalho e suor e buscavam lugar e abrigo nos aviões de volta a Portugal?
- As revelações são de Piotr Evsiukov, primeiro embaixador soviético em Moçambique, em “Memórias sobre o trabalho em Moçambique”.
Maputo (Canal de Moçambique) - Diplomatas soviéticos que deram início às relações diplomáticas entre URSS e Moçambique criticam a política de Samora Machel face à população portuguesa branca, sublinhando que, nesta área, o Presidente moçambicano se comportou de forma semelhante ao ditador soviético, José Estaline.
“De forma dura, como Estaline, Samora Machel tratou os portugueses que viviam em Moçambique. Muitos deles receberam com entusiasmo os combatentes pela independência quando entraram em Lourenço Marques e estavam prontos a cooperar de todas as formas com a FRELIMO”, escreve Piotr Evsiukov, primeiro embaixador soviético em Moçambique, em “Memórias sobre o trabalho em Moçambique”, a que a LUSA teve acesso. “Não obstante, também aqui se revelou o extremismo de Samora Machel. Ele apresentou condições tais de cidadania e residência aos portugueses em Moçambique que eles foram obrigados, na sua esmagadora maioria, a abandonar o país... Com a fuga dos portugueses, a economia de Moçambique entrou em declínio”.
Piotr Evsiukov recorda que Machel era um convicto admirador de José Estaline. “Samora Machel falou-me várias vezes do seu apego e respeito por José Estaline.”
Consultem o artigo, na íntegra em:
E foi a terroristas deste calibre que Portugal entregou o destino de Moçambique e que o “frelimismo” conduziu ao lugar dos países mais pobres do mundo.
Por último, quero incluir neste "post" o indivíduo que, abusando do poder que tinha na Frelimo e "conselheiro" do Samora Machel, condenou, em Nachingwea, os opositores da Frelimo, que vieram a ser executados em vários campos de concentração, nomeadamente, em Netelela (ex-Nova Viseu).
Este indivíduo exerce funções de alto nível, em Moçambique, mandatado pelos governos de Samora, Chissano e Guebuza.
Os seus crimes não merecem qualquer perdão dos moçambicanos e da Comunidade Internacional. Cometeu crimes contra a Humanidade.