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Avançamos no terreno, um pequeno planalto, até que encontramos um local, aparentemente seguro, para descansarmos. O local era constituído por algumas palhotas abandonadas e cercadas de vegetação pouco densa, o que constituía um óptimo local para descansar e montar a segurança. A floresta mais densa situava-se e mais de cem metros de distância. Do meu ponto de vista, era o local ideal para passar a noite. Marquei o meu local de dormida e, juntamente comigo, iria ficar o guia que nos havia sido entregue pela PIDE. À entrada da palhota que escolhi, coloquei o Vitorino com a sua HK21 e o Taculera, com o morteiro 60.
A palhota não era nada confortável, dava a quantidade de bicharada que a infestava. Foi uma noite de vigília, dado que não consegui pegar sono.
No dia seguinte, cerca das quatro e meia da madrugada, sem que nada o pudesse prever, surge um ataque da Frelimo e o local onde me encontrava era constantemente varrido por rajadas de metralhadora. Ao verificar que dentro da palhota nada poderia fazer, rastejei até à entrada, onde o Vitorino já disparava rajadas de metralhadora, mas o Taculera não conseguia manejar o morteiro, dado encontrar-se mais desabrigado. Pedi ao Taculera para me atirar o morteiro e as munições. Comecei então a disparar para o local de onde vinha o ataque. Os disparam começaram a amainar, até que se calaram.
Mandei, de imediato reunir o GE, a fim de deixar o local e avançarmos para a parte mais densa da floresta. Fiquei consciente de que a base se situava nas imediações, portanto, bastante perto.
Depois de todo o dispositivo preparado e, de acordo com as indicações do guia, começamos a avançar, já não em fila indiano, mas, em linha, a fim de conseguirmos abranger uma maior área de terreno. Com todas as precauções, avançamos, entramos na parte mais densa da floresta e parecia que nada nos incomodava, mas a concentração era total, com o GE dividido por três comandos, o da direita, comandado pelo Adão, o da esquerda, pelo Vasco e eu no meio, mas sem perder de vista quem quer que fosse. Continuamos a avançar, abrigados pelas árvores da floresta que, no início era bastante densa e permitia uma boa progressão, mas passadas umas boas dezenas de metros, tornava-se muito menos densa e com o capim muito rasteiro. O único avanço possível era a rastejar e abrigar-nos de árvore em árvore.
Passado pouco tempo, surge-nos uma barreira de fogo do inimigo, de tal modo forte que nos impediu a progressão. Já não havia capim e estávamos ali expostos ao fogo do inimigo. Seriam cerca das seis horas da manhã. A barreira de fogo era tão grande que dei ordens para disparar só com alvos à vista, para não gastar munições que, mais tarde, nos poderiam ser preciosas. Ali estivemos debaixo de fogo contínuo, que não deixava avançar um centímetro que fosse. E para estupefacção minha, a quantidade de fogo continuava a aumentar, com um potencial que nunca imaginei e que ameaçava cercar todo o Grupo.
Apercebi-me do perigo que a situação representava e, cerca das nove horas, pedi apoio aéreo para a situação e porque tinha a noção que estava mesmo em cima da base. A resposta foi de que deveria segurar a posição, porque o Comando de Operações, iria assegurar a logística. Lá continuamos no local, sem poder avançar fosse o que fosse, mas a minhas eram ordens eram rígidas e bem precisas, gastar o menos possível de munições e fiquei a aguardar o apoio aéreo solicitado, dado saber que, no aeroporto de Tete, estavam estacionados alguns aviões Fiat.
Dentro do possível, aguentei a posição, à espera de novidades.
Cerca da uma hora da tarde, recebo ordens para abortar a operação, porque não era possível o apoio aéreo. Foi pior a emenda do que o soneto. O Grupo estava, quase completamente cercado e uma retirada, naquelas condições, seria extremamente perigosa, por podermos ser alvo de perseguição por parte do inimigo que me parecia reunir guerrilheiros em número suficiente para o fazer. Era necessária a inteligência e o sangue frio. Pensei, por uns momentos, na forma de fazer a retirada sem perseguições. Resolvi, então, dar ordens de fogo intenso sobre o inimigo, enquanto, com dois operadores de morteiro, retirei para o local onde tinha estado acampado, não, sem, antes disso, ter dado ordens ao Adão e ao Vasco, para recuarem os respectivos pelotões, quando as granadas de morteiro começassem a explodir. Recuei algumas centenas de metros com os dois morteiros e uma HK21. Aí comecei a disparar os morteiros e o fogo do inimigo começou a diminuir e a afastar-se, foi então que começaram a aparecer no local onde eu estava os pelotões do Adão e do Vasco. Entretanto, com eles veio mais um morteiro e os disparos a aumentarem. Passado algum tempo, mandei disparar as metralhadoras HK21 e os tiros do inimigo começaram a acabar, até ao silêncio total.
Depois de todos reunidos, avançamos para uma encosta dominante, comemos a ração de combate e encetamos a regresso ao acampamento.
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Ovar, 10 de Março de 2010
Álvaro Teixeira (GE)