Hoje, resolvi descrever um pouco da minha vida militar, durante a Guerra Colonial (Os meus primeiros 6 meses) passados em Olivença, na 3ª. CCaç. Do BCaç. 20 (Tigres Negros do Niassa)
Conforme já disse no post “Pequeno Resumo da minha vida Militar”, embarquei no Aeroporto do Figo Maduro, em 06/10/1972, com destino ao BCaç. 18, em Lourenço Marques. Ao meu lado viajava um furriel, que passou, quase toda a viagem, a contar-me histórias da Guerra e falou-me muito de um furriel enfermeiro seu amigo, Noronha, que estava em Olivença. Dizia-me que era um lugar terrível, no extremo norte do Niassa. Fui ouvindo, mas, como o meu destino era outro, não me sentia amedrontado.
No dia 7, fomos os dois apresentar-nos no BCaç. 16 (Beira), a fim de apresentarmos as nossas guias de marcha. Qual não foi o meu espanto ao receber guia de marcha, para embarcar no dia seguinte, com destino a Olivença. No dia 8 de Outubro, cheguei a Nampula e entregaram-me os documentos para ir para Vila Cabral, de comboio. A viagem foi agradável e era interessante a quantidade de gente que aparecia nas “estações”, onde o comboio parava. Era uma autêntica festa. Vi paisagens lindíssimas, o verde das plantas era, para mim desconhecido, bem como todos aqueles odores que entravam pela janela, nos intervalos do fumo das duas locomotivas. Após muitas horas de viagem, acabei por adormecer. Passamos pelo Catur, onde houve, segundo me disse o alferes GE Mascarenhas, que tinha havido um ataque ao comboio, mas, como dormia profundamente, não me apercebi de nada.
Após mais duas dezenas de horas de viagem, chegamos à estação de Vila Cabral. Muita gente na estação, muita confusão e alguns militares, que estavam estacionados nesta cidade e que tinham, como rotina, ir ver a chegada do comboio, para verem se encontravam alguém conhecido. Pego minha bagagem e, do meio daquela gente, ouvi pronunciar o meu nome. Achei estranho e, logo a seguir, aparece-me um vizinho e ex-colega da escola primária, o José Marques (falecido com 42 anos), que estava nos “serviços de escuta”. Foi de uma alegria enorme o reencontro de dois amigos de infância, num local tão distante da nossa terra.
Apresentei-me no BCaç. 20, onde encontrei outro amigo meu, o capitão miliciano Temudo. Após cumpridas as formalidades, instalei-me na Pensão Niassa, onde fiquei dois dias, à espera de transporte para Olivença.
A primeira noite, em Vila Cabral, foi de festa, com mais amigos de Ovar, no Restaurante Planalto, onde todos jantámos, com muitas “bazucas” de Laurentina, tendo eu imposto que a despesa era toda por minha conta.
O dia seguinte foi, com a companhia do Zé Marques, destinado à visita à cidade e o almoço foi em casa do fotógrafo de Vila Cabral, já não lembro do seu nome, e que era natural de Ovar. Para mim, tudo era novo, tudo era diferente.
O jantar desse dia foi Restaurante Miralago, onde se comia muito bem, com o meu amigo do costume. Apresentou-me ao dono do restaurante e, qual não é o meu espanto, ao saber que a sua esposa era de Ovar. O jantar foi oferecido. O dono do Miralago acabou por vir para Portugal, na sequência do processo de “descolonização” e montou um restaurante, perto da minha casa, com o nome de “O Melro”, que, além da ementa habitual, era especializado em cozinha africana e a clientela era muita.
Ao terceiro dia, pela manhã, fui para o aeroporto, para apanhar o avião para Olivença. O aeroporto estava vazio e só via um pequeno Cessna na pista. Aparece-me, então, o famoso Subtil, que me pergunta se era eu que ia para Olivença, respondi-lhe que sim. Entrei no “avião”, com tudo muito apertadinho e levantamos voo. Primeira paragem, Unango. Saí um pouco do avião, talvez nem 10 minutos e logo me aparece outro amigo, o Justino, mais conhecido pelo “Macaco”.
A segunda paragem foi em Macaloge, mas aí, nem saí do avião, devido a má disposição, mas pelo que apercebi, era uma localidade bastante maior que Unango e havia mais militares, porque era sede de Batalhão.
Terceira paragem, Pauíla. Terrível, um aquartelamento perdido no meio da mata. Não havia população civil, só militares. Também, aí, encontrei outro amigo, o furriel Flores, actualmente arquitecto.
Depois de termos levantado voo de Pauíla, passado algum tempo, diz-me o Subtil: “Comece a olhar para o mato que vai pisar, porque estamos a chegar a Olivença.” A minha curiosidade aumentou e não era motivo para menos, depois do que ouvi durante a viagem Lisboa-Beira, no dia que estive em Nampula e nos dois dias que passei em Vila Cabral, pensei: estou a chegar ao inferno. O avião passa ao lado do Aquartelamento, já em baixa altitude, e deu para observar que não era a Olivença que descreveram. Aterramos e, quando saí do avião, oiço: “Oh Rosa, já chegou o teu checa”. Não me apercebi, naquele momento, do significado daquela frase e só o vim a saber, depois de chegado ao aquartelamento. Afinal, eu ia render o furriel Rosa, que tinha já o tempo suficiente de “mato”, para pedir a sua transferência. Tinha pedido a transferência para Lourenço Marques, de onde era natural, para o BCaç. 18. Fiquei, então a entender, porque fui “recambiado” para Olivença.
A 3ª. CCaç. do BCaç.20 era constituída por militares moçambicanos e integrada por dois pelotões do Batalhão de Macaloge. Uma grande parte dos graduados era oriunda de Portugal e com um outro moçambicano (penso que 4 furrieis e um alferes).